O direito sucessório é uma questão sensível e delicada que surge após o falecimento de uma pessoa [o que, por si só, já é uma situação dolorosa]. A partilha dos bens deixados pelo ente querido pode se tornar um assunto complexo quando apenas um dos herdeiros passa a usufruir do patrimônio, deixando os demais herdeiros privados de perceber [receber] os frutos [lucros] daquele bem.
Situações como essa podem gerar incertezas, preocupações e desconforto entre os demais sucessores. Para lidar com essa questão de forma justa e respeitosa, é importante conhecer o direito e os procedimentos legais aplicáveis nesse caso.
É preciso, inicialmente, compreender as regras de direito sucessório aplicáveis ao caso concreto, pois a situação pode ser modificada de acordo com cada grupo familiar e de acordo com cada situação. Fatores como regime de bens, filhos, companheiros, testamento e até mesmo momento da morte podem mudar os rumos de uma sucessão.
Apenas como exemplo, o Código Civil dispõe, no art. 1.831, que, se o falecido era casado ou mantinha união estável, o cônjuge sobrevivente tem o direito real de habitação, independentemente do regime de bens, desde que seja sobre um único bem imóvel destinado à residência da família. Essa regra, contudo, poderá ganhar contornos diferentes, caso o falecido não tenha deixado cônjuge sobrevivente. Ganha contornos diferentes, também, se o falecido tiver deixado mais um imóvel — neste caso, apenas em um dos imóveis recairá o direito real de habitação.
Outro ponto relevante que deve ser inicialmente analisado é se o falecido deixou testamento. A busca do testamento é feita de forma eletrônica, só pode ser feita com a certidão de óbito em mãos e o resultado demora em torno de 3 (três) dias.
Em caso de ser localizado testamento, é preciso analisar seu conteúdo para verificar se há cláusulas específicas sobre o imóvel em questão. O testamento pode determinar quem receberá o imóvel ou estabelecer algum tipo de usufruto em favor de um dos herdeiros. E esse, também, é um fator que pode mudar todos os passos seguintes.
Não havendo direito real de habitação, não havendo testamento, os herdeiros passam a exercer, desde a data da morte, condomínio sobre o bem [art. 1.791 do Código Civil]. É dizer, os co-herdeiros passam a ter uma fração ideal [um percentual] sobre o imóvel e passam a ter direito sobre os frutos que são retirados do bem, que, frise-se, é de todos. Esses frutos são representados, por exemplo, por um aluguel, por uma plantação ou criação de animais que houver numa fazenda.
Assim, se um herdeiro estiver usufruindo de forma exclusiva de algum dos bens sem autorização dos demais, ele deverá pagar um valor a título de aluguel, independentemente de estar residindo no local ou alugando a um terceiro.
Mas há um detalhe importante: caso o herdeiro esteja usufruindo exclusivamente o bem, é importante que os demais herdeiros enviem uma notificação cientificando-o a respeito da insatisfação pelo uso exclusivo do bem. Fique atento aos detalhes: somente com a demonstração de resistência e insatisfação pelo fato de o herdeiro usufruir o bem é que nasce a obrigação de suportar os alugueres. Esse é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:
É possível o arbitramento de aluguéis pelo uso exclusivo de bem imóvel por um dos ex-cônjuges, a partir do momento em que este toma conhecimento inequívoco do inconformismo da outra parte em relação à fruição exclusiva do bem, o que, via de regra, ocorre com a citação, mas nada impede que seja em momento anterior, quando há notificação extrajudicial ( AgInt no REsp n. 1.782.828/PR , Relator Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, DJe de 5/11/2019
Algumas providências podem ser tomadas após a notificação: é possível o pedido de arbitramento de aluguel pelo juiz, exatamente em razão daquele herdeiro estar utilizando exclusivamente um bem que é comum ou, até mesmo, uma ação judicial [ação possessória ou reivindicatória, a depender da situação] com o fim de que ele desocupe o imóvel.
Uma outra providência que também pode ser analisada é a própria venda do imóvel: o juiz pode autorizar a desocupação e a venda no mesmo ato, fazendo cessar a fruição exclusiva por apenas um dos herdeiros.
Uma das melhores formas de resolver conflitos sucessórios é por meio do diálogo entre os herdeiros: a negociação com técnica tem se mostrado cada dia mais eficaz. É essencial que as partes envolvidas se comuniquem, ou utilizem terceiros para intermediar esse diálogo, sempre de forma aberta e honesta, buscando compreender os interesses e necessidades de cada um.
Por fim, lidar com a situação em que apenas um herdeiro usufrui do imóvel deixado pelo falecido pode ser um desafio, mas é importante buscar resolver o conflito de forma justa e legal. O diálogo, a compreensão da legislação sucessória e, se necessário, a orientação de um advogado são essenciais para garantir que todos os envolvidos recebam seus direitos de maneira respeitosa e harmoniosa. Em último caso, a via judicial pode ser acionada para solucionar a disputa e promover a partilha adequada dos bens.
Imagem: Arte Migalhas